quarta-feira, 28 de março de 2012

Executivo aprende na Disney como tratar o cliente

Uma das tarefas do diretor de recursos humanos do laboratório Merck Sharp & Dohme do Brasil (MSD), Marcelo Lima, consiste em mostrar aos profissionais de venda que ingressam na empresa como se portar durante as visitas que fazem aos clientes. Uma vez nos consultórios, os propagandistas, como são chamados, precisam convencer os compradores em potencial da utilidade dos produtos fabricados pela Merck. "É o momento mágico e nesse instante temos o dever de cativá-los", diz.

Marcelo Lima não pensava assim. Percebeu a importância desse processo no ano passado, quando participou de um curso de estilo de gestão no Disney Institute, nos Estados Unidos, ao lado de 150 executivos da MSD. Baseado no modelo adotado pela Walt Disney Company, o workshop fez com que o staff do laboratório ficasse mais atento à relação fornecedor-cliente e como esse contato é capaz de gerar frutos. Voltadas para executivos, as palestras acontecem no instituto, localizado nas adjacências dos parques temáticos, em Orlando, na Flórida.

Trata-se de um laboratório com objetivo de reunir variadas indústrias. A ideia é que todas apliquem em suas respectivas realidades a filosofia Disney, considerada modelo no quesito atendimento. A instituição existe há dez anos, mas foi em meados de 2000 que mudou sua estratégia e passou a trabalhar exclusivamente com diretores e gerentes das grandes corporações.

Os executivos da Merck Sharp & Dohme não foram os únicos brasileiros que participaram do seminário. Varig, Citibank, Credicard, Editora Abril, BCP Telecomunicações, Camargo Corrêa Industrial, Fundação Getúlio Vargas e Caixa Econômica Federal também decidiram adotar o padrão Disney em seus negócios. Quem participa garante que a experiência é válida.

O analista de treinamento da Varig, Milton dos Santos, esteve na escola há dois meses - no total a Varig levou 20 executivos. Santos passou quatro dias no Disney Institute, onde participou do curso de qualidade em serviços. Depois de conhecer a metodologia, os bastidores dos parques e os serviços, ele reconhece que o cliente não pode ter qualquer tipo de frustração. 'Hoje, quando recebo um candidato mostro que é fundamental humanizar o atendimento. Isso fascina', afirma. 'No caso da Varig, os funcionários devem ter em mente que a primeira vez no avião deve ser inesquecível, assim como a segunda, a terceira ou a última. Este é o nosso momento mágico. ' Santos conta que uma vez a bordo, as perguntas dos passageiros são semelhantes. 'Mas é obrigação da tripulação responder como se o questionamento fosse inédito. '

A doutrina Disney está focada num método particular: a reciclagem diária, isto é, a empresa parte do princípio de que precisa reinventar-se todos dias. Tudo para descobrir qual é o instante mágico entre visitante e corporação. Para isso, a equipe tem como lema uma das máximas de Walt Disney. 'Quando você acredita em uma coisa, acredite nela implícita e inquestionavelmente. ' Só a partir do entendimento da teoria pode surgir o comprometimento com o cliente, o desejo de inovar e a vontade de trabalhar em grupo sem o habitual clima de competição. 'Quando absorvi as informações consegui contextualizar a realidade da Disney e a da Varig', explica o analista de treinamento.

Em 1998, executivos do Citibank estiveram nos Estados Unidos e a experiência gerou dividendos. A empresa implementou um programa denominado 'Citipromise' - a meta é assegurar que a promessa de fidelidade do banco com o cliente, de fato, seja cumprida. Desde que foi estabelecido, 80% dos funcionários do Citi foram treinados no programa que ganhou algumas adaptações. Ao contrário dos quatro elementos fundamentais estabelecidos pela Disney (cortesia, eficiência, segurança e show), o banco decidiu instituir os próprios princípios (respeito, receptividade e know-how).

Além desses conceitos, faz parte do programa do Citibank uma estratégica criada para diferenciar o banco da concorrência. Chama-se estratégia dos 3Ds: diferenciação, delivery (entrega) e devoção à excelência. A intenção é dar suporte ao crescimento do negócio, como atestam Délsio Klein, diretor de recursos humanos do Citi, e Vera Rosolém, gerente de qualidade. Ambos participaram do curso há três anos.

Os executivos que decidem ir para a Flórida podem optar por diversos programas. Criatividade, liderança e excelência em operações são algumas das 11 alternativas disponíveis. A duração é de quatro dias.

Segundo Teresa Hergarty, gerente de serviços para grupos da Disney, quem participa, por exemplo, do curso de liderança, o mais procurado, aprende técnicas que ajudam a decifrar as expectativa dos clientes em relação aos serviços oferecidos pela empresa. "O profissional passa a observar como é possível transformar a visão do seu negócio em uma estratégica voltada para a prática", revela. "Para toda questão teórica, mostramos algum caso que tenha acontecido em um dos departamentos da Disney".

Nem todas as instituições, porém, levam os executivos para serem treinados na América. Algumas optam pela contratação de corporações que desenvolvem cursos a partir dessa filosofia e os aplicam no Brasil. A New Marketing é uma delas. Especializada no desenvolvimento e capacitação do profissional de marketing e vendas, a empresa utiliza o sistema batizado de Planejamento Estratégico Dinâmico (PED).

"Estabelecemos uma parceria com a Disney Company para podermos usá-la como exemplo. O curso tem como meta resgatar os valores das instituições participantes", explica Cláudio Tomanini, Presidente da New Marketing. "O desafio é mostrar a importância dos relacionamentos interpessoais, vivenciados de maneira exemplar em todos os segmentos da Disney". Tomanini ressalta que a tarefa mais importante nesse processo é relacionar quais são as principais qualidades da empresa, de acordo com os seus clientes e com o mercado, e quais seriam os ideais a serem praticados. "Quando descobrem, os executivos percebem como melhorar sua atuação".

Depois de participar de alguns cursos no Disney Institute, Cláudio Tomanini atesta que a fórmula de Walt Disney funciona porque está ligada à simplicidade e aos mínimos detalhes. "Em algumas ruas do parque Magic Kingdom há árvores artificiais que são pintadas diariamente", diz. "Simplesmente para que o visitante tenha a sensação de que o local foi inaugurado naquele dia e especialmente para sua alegria".

Tamanho zelo pode levar a exageros desnecessários. "Os constantes sorrisos dos funcionários da Disney por vezes demonstram falsidade", conta ele, que acerta os últimos detalhes para levar executivos do Beto Carrero World ao instituto. "Não estamos focados nessa questão. Trabalhamos no campo estratégico e o propósito é saber onde aplicar os pontos positivos da Disney nas empresas dispostas a melhorar o tratamento com o público".

Cláudio Tomanini acredita que a estabilização da economia e a globalização geraram mudanças nos treinamentos de equipe. "Cada vez mais os profissionais precisam compreender seu ambiente de negócio e aprender a potencializar as ferramentas oferecidas pela empresa onde atuam. A Disney é um exemplo do modelo de gestão ideal".

(Gazeta Mercantil)